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12 de Maio de 2024

CIDADES Segunda-feira, 22 de Julho de 2019, 08:00 - A | A

Segunda-feira, 22 de Julho de 2019, 08h:00 - A | A

ENTREVISTA DA SEMANA

Delegado Marcel Gomes: “No Brasil as discussões acerca de situações de legítima defesa ainda são muito polêmicas, não tem como a gente falar de uma jurisprudência solidificada"

Rayane Alves

Reprodução

 

Delegados da Polícia Judiciária Civil de Mato Grosso lançaram o livro “Tratado Contemporâneo de Polícia Judiciária”.  Um dos autores do livro, delegado Marcel Gomes de Oliveira, fala ao Notícia Max sobre a publicação, destacando que é um tema bastante atual, inclusive lembrando a declaração do governador do Rio de janeiro Wilson Witzel, de que estaria treinando snipers para estar matando criminosos em potenciais agressões, destacando qual seria a interpretação que deveria se dar a instituição da legítima defesa. 

 

“É justamente assim, porque fala assim: é um perigo atual ou iminente? Atual ela não precisa de muita definição porque é aquela que está acontecendo no presente momento. A questão que gera discussão principalmente sobre a interpretação a ser dada é sobre uma agressão iminente, o que seria uma agressão iminente? Eu vou montar um conceito bem básico que seria aquela agressão que está prestes a ocorrer, aí você tem que se perguntar a discussão central foi essa? Pelos dados que você conhece, tudo que foi reconhecido no dia a dia e não só na televisão, a polícia subindo uma favela e criminosos posicionados atrás de alguma barreira outra coisa com armamento pesado sem efetuar os disparos, porque aí seria uma agressão atual, mas apenas portando essas armas, seria uma agressão iminente, ou seja o policial avistar aquela situação poderia estar neutralizando esse criminoso, abatendo este criminoso. Então tem uma central que é sobre justamente isso, está relacionado aos snipers e a questão da legítima defesa policial”, frisa o delegado.

 

O livro, diz ele, possui muitos artigos escritos por delegados de Mato Grosso, inclusive o dr. Luiz Henrique Damasceno, que é o responsável pela operação que prendeu Arcanjo e outros delegados também que fizeram grandes operações, e todos os outros que estão relacionados nos livros são atuais estão envolvidos em operações.

 

Notícia Max - Qual é o nome do livro?

 

Delegado Marcel Gomes de Oliveira - Tratado contemporâneo de Polícia Judiciária. Acontece que atualmente existe um crescimento relacionado aos temas de policiais de forma geral, em segurança pública como um todo. Nos últimos anos isso ganhou muita notoriedade e era uma área muito escassa de produção doutrinária e produção de conhecimento, e de 10 anos para cá cresceu muito, principalmente com vários delegados e pessoas colaboradoras da área de segurança pública escrevendo sobre o tema, e isso ganhou um foco especial justamente por serem pessoas que já atuam na área e têm um maior trato de convivência com a arma e consequentemente traz essa visão para dentro da escritura.

Reprodução

livro

 

 

Como você pode ver, há pessoas alheias à segurança pública escrevendo sobre esses assuntos, mas só quem está dentro mesmo para dar um parecer mais confiável à situação. Então eu acredito que o livro vai de uma forma geral para todos os servidores da segurança pública e também para área jurídica e pessoas que estão dentro das áreas, escrevendo sobre assuntos atuais, inclusive um dos assuntos incluídos no livro é a questão da medida protetiva que foi deferida pelo delegado de polícia para as mulheres vítimas de violência doméstica, e coincidentemente já estava escrito o artigo e tudo mais, e foi aprovado há 15 dias essa medida, ou seja, já era um assunto que a gente já vinha discutindo e por acaso o governo veio aprovar. Defendemos essa tese. No dia 26 vai ter o lançamento completo da obra no Cine Teatro Cuiabá.

 

Notícia Max - Quantos delegados escreveram esse livro?

 

Delegado Marcel Gomes -  Seis delegados escreveram

 

Notícia Max - Em relação à legítima defesa, o senhor diz, por exemplo, que é sobre uma questão dos bandidos estarem com armamentos posicionados. O presidente Jair Bolsonaro mesmo tem discutido sobre a situação e você como delegado vai esperar receber um tiro para poder dar um outro tiro ou você vai se defender? Porque o cara está com uma arma apontada para você, pode atirar a qualquer momento e como que a gente pode fazer essa avaliação, dizendo que é certo dentro do artigo que o policial lá na frente não vai ser investigado por conta da profissão?

 

Delegado Marcel Gomes - É justamente esse ponto central que eu trago dentro desse artigo, ou seja, qual o âmbito, qual a largura da expressão da eminência no artigo 25 que trata da legítima defesa, e eu fiz a análise dessa expressão em todo direito internacional, porque do direito internacional a gente já conheceu o artigo 25 que trata justamente da legítima defesa.

 

No Brasil eu fui fazer uma pesquisa em todo direito internacional principalmente na Europa onde o direito, digamos, é mais antigo, as discussões são mais evoluídas, e foi justamente ali em Portugal, na Espanha, na Alemanha, para ver como o assunto era tratado dentro desses países, e pude verificar que a discussão que é travada aqui hoje no Brasil se o criminoso portando uma arma numa situação de iminente agressão, daí poderia o policial já estar efetuando um disparo contra ele, e achei jogados dentro do Tribunal do Supremo Tribunal Federal da Alemanha, que enfrentou essa situação e o caso lá específico era de um guarda florestal que estava tomando conta de um parque, e o caçador estava armado e esse guarda já teria dado a ordem de parada, mas ele correu, mas provavelmente para se direcionar a um local mais privilegiado para tirar da sua zona. O guarda nesse momento dele não obedecer à ordem de parada e para se proteger no local, efetuou um disparo contra ele, ou seja, o guarda efetuou o disparo contra ele sem sequer ele efetuar um disparo contra o guarda e lá os ministros da Suprema Corte alemã entenderam que esse guarda agiu em legítima defesa, justamente por estar diante de uma agressão iminente, uma circunstância que por questões fáticas estava próxima de acontecer.

 

Notícia Max - Então no caso no Brasil é discutido dessa maneira também ou ainda não? Porque a gente vê muito isso na mídia.

 

Delegado Marcel Gomes - No Brasil as discussões acerca de situações ainda são muito polêmicas, não tem como a gente falar uma jurisprudência solidificada sobre o tema, muitas vezes fica na análise subjetiva, ou seja, cada caso é um caso e aí que eu entro justamente na legislação de Portugal, porque não é legislação de lá, ela também trata de legítima defesa, mas ela diz as situações profissionais da segurança pública onde poderá estar neutralizando e até abatendo criminosos e quais são as situações. 

 

Então no momento que você objetiva como você vai poder utilizar a arma para bater um criminoso, é preciso que você tenha conhecimento do instituto de legítima defesa, porque você entra em outro instituto que é o estrito cumprimento do dever legal, porque o estado fala: olha, se um criminoso está com uma bomba pronta para explodir no metrô e ferir um número indeterminado de pessoas, o policial tem o dever, não é uma opção, aí ele tem que tirar, ele é obrigado, isso em Portugal, e nessa situação ele não está agindo com legítima defesa porque não há sequer nenhuma agressão, nenhuma suposição de agressão, mas ele tem que agir porque o estado fala.

 

Notícia Max - Mas o que o senhor defende?

 

Delegado Marcel Gomes - Eu defendo mais unção das experiências do conceito de eminência da legislação brasileira com a aproximação da legislação portuguesa, por que veja, se você sair dessa subjetividade da margem para o juiz aqui de Mato Grosso, porque aqueles decidem de uma forma e o juiz de São Paulo decide outra forma, o Tribunal de Justiça decide de outra forma e o Tribunal de Justiça de outro estado decide de forma diferente, eu quero que essa situação chegue ao Tribunal Superior, que é o STJ, para que ele uniformize essa jurisprudência.

 

Hoje não é uniformizado, então para área de segurança e para policial seria muito melhor eles saberem as situações em que o Estado fala: olha, nessa situação você pode agir, olha se o criminoso estiver portando uma arma de longo alcance com alto poder de fogo de destruição os policiais estão autorizados a utilizar de poder letal contra os mesmos, e isso é legítima defesa? Não, isso não é legítima defesa porque a gente costuma chamar isso na legislação de estrito cumprimento do dever legal, porque ele tem obrigação de agir naquela circunstância, na legitima defesa você defende uma pessoa que está sofrendo uma agressão.

 

Notícia Max - Mas no caso também é agressão contra policial, não só para terceira pessoa?

 

Delegado Marcel Gomes - Se supõe que o criminoso está em determinada localidade com uma arma de grosso calibre sem atirar contra ninguém, e não tem nenhum policial ali naquela circunstância. Mas você conseguiu visualizar ele com essa arma, você vai atirar ou não atirar? Ele não está representando risco atual ou iminente nessa situação, mas se os policiais estão subindo a favela e tem um policial de sniper em uma visualização privilegiada, e nessa subida tem uma troca de tiro e esse policial consegue visualizar ele, se esse policial atirar no outro e matar, é legítima defesa porque ele está agredindo os policiais que estão embaixo e o sniper atira para protegê-los. 

 

O que estou falando é tem alguém sentado na cadeira de um bar com fuzil, ele não está agredindo ninguém, ele não está oferecendo risco a ninguém e nem próximo de agredir, porque não tem nenhum policial próximo ali e esse policial vai estar autorizado a matar ele? Nesse sentido ele não pode atirar porque não existe a legítima defesa.

 

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