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CIDADES Segunda-feira, 27 de Maio de 2019, 11:24 - A | A

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SENSACIONALISMO OU MONSTRUOSIDADE?

Desfile em prol da adoção causa revolta e é comparado a feiras de escravos e de animais

Redação

Reprodução

 

O evento "Adoção na Passarela", que reuniu crianças e adolescentes aptos para adoção realizado em Cuiabá na noite da última terça-feira (21), no Pantanal Shopping, ganhou repercussão nacional, sendo comparado a feira de escravos e Kennel Club. 

 

Mas a repercussão não foi apenas negativa, a organização do evento disse que ele promove a "convivência social" e "mostra a diversidade da construção familiar", e o desembargador Orlando Perri classificou as críticas como ignorância da população em relação ao processo de adoção no Brasil, enquanto o juiz Túlio Duailibi Souza, coordenador da Comissão da Infância e Juventude do Poder Judiciário de Mato Grosso, defendeu que o desfile foi feito de forma responsável, com interesse em ajudar as crianças e não prejudicá-las. 

 

A polêmica foi tamanha que a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM) enviou ofício ao Conselho Federal da OAB e ao Ministério Público do Mato Grosso pedindo informações sobre a iniciativa. Lembrando que o desfile faz parte da “Semana da Adoção”, idealizada pela Associação Mato-grossense de Pesquisa e Apoio à Adoção (Ampara), em parceria com a Comissão de Infância e Juventude (CIJ) da Ordem dos Advogados do Brasil no Mato Grosso (OAB-МT). 

 

Um dos mais críticos ao evento foi renomado advogado Eduardo Mahon, que disse que a ação foi equivocada e se assemelha à venda de escravos. "Olha, gente, sem querer ser chato, mas já sendo. Antes de tudo, devo dizer que a Ampara é uma instituição muito séria. Devo, entretanto, pedir mil desculpas a quem pensa diferente e à Ampara, mas as crianças na passarela para pretendentes ver o quão bonitas, simpáticas e desenvoltas são, parece-me uma antiga feira de escravos, onde os senhores viam os dentes e o corpo dos africanos para negociar o lance. Não acho legal, aliás, acho péssimo. Não porque seja um desses conservadores que quer esconder, apagar, fingir que não existe rejeição social, etc. já estive nessa lista, fiz visitas e sei bem que essas crianças precisam de visibilidade, exposição positiva, ressignificação de lugar e autoestima, mas não assim. Não em uma passarela, não em um shopping, não para o público aberto. Não assim! Não assim!! Não assim!!!”, diz trecho da postagem do jurista no Facebook. 

 

O ex-presidenciável Guilherme Boulos (Psol) também se pronunciou sobre o desfile por meio do Twiter para falar que considerou o evento  uma "perversidade". 

 

 "A passarela da adoção, em Cuiabá, expondo crianças de 4 a 17 anos para a escolha dos pretendentes pais é de uma perversidade inacreditável. Os efeitos psicológicos da exposição, expectativa e frustração dessas crianças pode ser devastador, ainda que a intenção tenha sido outra", diz trecho da publicação. 

 

O jornalista Fernando Brito, do site Isso É Notícia, foi mais além, comparando o desfile a feiras de adoção de animais, afirmando que as crianças e adolescentes desfilaram ante uma plateia de classe média, encantada como quem vai a um pet shop. 

 

 “Adoção, algo personalíssimo, decisão íntima da família, aceitação emocional da criança, vira, assim, um desfile como o de Kennel Club, onde a beleza das carinhas, o estilo do penteado e o andar gracioso passam a ser os critérios de “pegar ou largar”. Ajudados, claro, pela “roupinha gourmet’. São, certamente, “homens de bem” e “senhoras virtuosas” os que estavam na plateia, prontos a escolher um menino ou menina como se fossem um cocker spaniel ou um bichon frisé. Tão imbuídos do bem que até poderiam escolher uma criança mulatinha, para provarem que não têm preconceito”, diz trecho da matéria. 

 

A ex-deputada federal Manuela D'Ávila (PCdoB) lamentou o evento. "Acho que essa é uma das notícias mais tristes que li. Crianças em uma passarela, cheias de sonhos e desejos, buscando aprovação a partir de um desfile, como se parar amar um filho tivéssemos que admirá-los fisicamente", disse, em publicação feita na quarta-feira em seu Instagram. 

 

A Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, que faz parte do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MDH), manifestou "seu pesar" sobre o evento, sem entrar em maiores detalhes sobre medidas cabíveis. 

 

Já a Defensoria Pública de Mato Grosso emitiu um comunicado repudiando o evento. "Corre-se o risco de que a maioria dessas crianças e adolescentes não seja adotada, o que pode gerar sérios sentimentos de frustração, prejuízos à autoestima e indeléveis impactos psicológicos", diz a instituição. 

 

Por meio de nota, a Associação Mato-grossense de Pesquisa e Apoio à Adoção (Ampara), em parceria com a Comissão de Infância e Juventude (CIJ) afirmam que “em nenhum momento houve a exposição de crianças e adolescentes” e que eles não foram obrigados a participar da iniciativa. “Nenhuma criança ou adolescente foi obrigado a participar do evento e todos eles expressaram aos organizadores alegria com a possibilidade de participarem de um momento como esse”, diz o comunicado. 

 

Segundo os organizadores, a ação representa uma oportunidade para as crianças integrarem “uma convivência social, diretriz do Plano Nacional de Convivência Familiar e Comunitária” e que o desfile foi apenas uma das ações da “Semana da Adoção”, que é composta por “palestras, seminários e recreação para as crianças”. 

 

Conforme o juiz Túlio Duailibi, as críticas ao evento foram muito pesadas, enquanto teve mais benefício do que prejuízo para as crianças. 

 

"Alguma coisa deve ser feita para que essas crianças sejam lembradas pela sociedade e esse evento foi direcionado para que essas crianças pudessem ter uma visibilidade responsável para que dali surgisse naturalmente um interesse das famílias pela adoção", afirmou. 

 

Ele avaliou que os juízes das Varas da Infância e da Adolescência que autorizaram a participação das crianças no desfile não viram no pedido uma situação que expusesse de forma irresponsável ou que tornasse vulnerável aquelas crianças participantes do evento. "Se eles tivessem observado alguma exposição desnecessária, não teriam autorizado", pontuou o magistrado, responsável pela Comissão da Infância e Juventude do Poder Judiciário de Mato Grosso. 

 

O desembargador Orlando Perri destacou que o trabalho que a Ampara realiza é imprescindível, e a presidente da instituição sempre foi apaixonada pela causa, e as críticas se devem ao fato do desconhecimento da legislação.

 

"As críticas que estão sendo feitas só mostram um profundo desconhecimento da legislação de adoção no Brasil. As pessoas falam como se o evento tivesse tentado vender as crianças, mas isso é absolutamente mentira. A legislação não permite que isso seja feito, e para adotar é necessário fazer um cadastro, e passar por um longo processo burocrático. O evento fei feito somente para chamar atenção para a causa”, disse.

 

Vale destacar que esse não foi o primeiro desfile com crianças e adolescentes. Em novembro de 2016 o projeto ‘Adoção na Passarela’ da Associação Matogrossense de Pesquisa e Apoio à Adoção (Ampara) foi realizado no Várzea Grande Shopping, porém, as repercussões foram todas positivas, com o evento recebendo elogios de todos os segmentos, bem diferente do realizado na última terça-feira (21) no Pantanal Shopping.

 

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