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ESPORTE Terça-feira, 23 de Abril de 2019, 17:33 - A | A

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NÃO

Análise: os "nãos" seguidos à seleção escancaram os (muitos) problemas de Zé Roberto rumo a Tóquio

Globo esporte

Os números, claro, ligam o alerta. Na manhã de segunda-feira, Dani Lins usou as redes sociais para anunciar seu pedido de dispensa da seleção brasileira. Mais tarde, em nota oficial publicada em seu site, a Confederação Brasileira de Voleibol divulgou que Gabi Cândido, jovem ponteira do Sesi-Bauru, havia feito o mesmo. As duas se juntaram a outras quatro jogadoras que seguiram o mesmo caminho. A pouco mais de um ano dos Jogos de Tóquio, Camila Brait, Thaísa, Adenízia e Tássia também preferiram dizer não ao chamado de José Roberto Guimarães. Ainda que os motivos possam ser legítimos, a debandada ganha ares de boicote e exige, ao menos, uma reflexão. No vácuo de cada ausência, fica a pergunta: por quê?

 

Em 2008, a alguns meses da convocação para a Olimpíada de Pequim, Fernanda Venturini procurou Zé Roberto. Estava sem jogar havia um ano, mas queria voltar à seleção para buscar o sonhado ouro olímpico. Pelo talento da levantadora, uma das melhores da história, o técnico balançou. Pesou, no entanto, a necessidade de ter o grupo em suas mãos. Disse não à veterana e bancou Fofão e Carol Albuquerque, que levariam o Brasil pela primeira vez ao alto do pódio em uma Olimpíada. Eram outros tempos.

 

Com a queda precoce nas quartas de final dos Jogos do Rio, muitos enxergaram uma necessidade de renovação na seleção. O caminho foi aberto com o adeus de Sheilla, Fabiana e Fernanda Garay à equipe – Fabi havia feito o mesmo dois anos antes. Zé, então, começou a fazer suas experiências logo no primeiro ano do novo ciclo. Queria testar algumas promessas e outras jogadoras que ainda não haviam tido chances com o treinador. A tal renovação, porém, não se firmou.

 

Nos anos seguintes, algumas jogadoras lidaram com problemas físicos, como Natália, Gabi e Thaísa. Outras precisaram se afastar por escolhas pessoais, como Dani Lins, mãe pela primeira vez. Sem alguns de seus pilares dentro de quadra, Zé Roberto teve problemas para encontrar substitutas. Tinha o Mundial pela frente – e a pressão pela busca de um título que o Brasil ainda não tem.

 

Zé, então, chamou suas veteranas, ainda que longe de seus melhores dias. Até Jaqueline foi testada como líbero, sem muito sucesso. O técnico, porém, quis arriscar. No Japão, Thaísa e Dani Lins não conseguiram voltar ao auge a tempo, assim como Fernanda Garay. O retorno da ponteira era a grande esperança do treinador para o Mundial. As apostas, para o azar de Zé e da torcida, não funcionaram, e o apego a alguns nomes cobrou um preço. O sétimo lugar escancarou os problemas da equipe.

 

Faltam peças em algumas posições. Como uma oposta que consiga ser opção para o lugar de Tandara, tão explorada justamente por não ter substituta à altura no momento. Ou uma líbero para fazer frente a Suellen. A um ano dos Jogos, já não há tanto espaço para testes. Há, é claro, o desgaste natural do tempo. Desde 2003 à frente da seleção, o vitorioso Zé Roberto havia previsto sua despedida no Rio. A sofrida queda dentro de casa o fez adiar os planos, mas também prolongou uma relação que já não é tão simples quanto antes.

 

Para uma seleção que sonha com o tricampeonato em Tóquio, o ano pré-olímpico talvez seja tão importante quanto o da própria Olimpíada. Quando seis jogadoras pedem dispensa, é preciso entender o porquê. Algumas citaram escolhas pessoais, outras problemas físicos. É difícil acreditar que Zé Roberto não soubesse das decisões. Ao bancar a convocação, parece ter ficado à espera de respostas públicas.

 

O caso mais simbólico talvez seja o de Camila Brait. Após ser cortada às vésperas dos Jogos do Rio, assim como havia acontecido em Londres 2012, a líbero anunciou que não jogaria mais pela seleção. Seu nome, então, foi surpresa na primeira convocação do treinador. Ao anunciar que não voltaria, Camila disse ter conversado com o técnico e explicado seus motivos para dizer não. Pediu um pouco mais de tempo “para entender”. A mágoa pelos cortes, parece, ainda não foi curada. Vai fazer falta.

 

Em uma entrevista ao jornalista Daniel Bortoletto, do portal “Web Vôlei”, Sheilla talvez tenha resumido bem um dos maiores problemas de Zé Roberto.

 

“Essa geração mais nova, isso não estou falando no vôlei apenas, estou falando na vida, não tem os objetivos muito claros na cabeça, como a nossa geração sempre teve. E não é só no vôlei. Se está bem na profissão, se não está, se vai sair, procurar outros caminhos… Não tem muita paciência, não tem muita resiliência para persistir e continuar. Acho que é isso que tem acontecido. A impressão que eu tenho, estando de fora em 2017 e 2018, acho que falta comprometimento da geração mais nova. Podem achar ruim de eu estar falando isso, mas é verdade. Geração que veio meio avoada. Acho que isso tem de mudar. Tudo o que faz tem de fazer com muito amor e dar muito valor para o lugar que está. E está faltando isso”.

 

Os muitos pedidos de dispensa nos últimos anos dão razão a Sheilla. A seleção parece ter deixado de ser prioridade. A temporada apertada, com muitos jogos e viagens, gera um desgaste. A pressão por resultado, algo mais que natural depois de dois ouros olímpicos, também atrapalha. Mas não deveriam ser motivos para dizer não a uma convocação. Dizer que a seleção é um sonho sempre foi lugar-comum na fala de atletas de todos os esportes. Nos últimos tempos, porém, negar um chamado à seleção feminina parece ter ficado mais fácil – e atraente.

 

Em alguns dos pedidos de dispensa de agora, as jogadoras falaram em portas abertas. Não negaram, então, um retorno à equipe no ano que vem. Ano de Olimpíada. Será que Zé aceitaria a volta de quem disse não? Negar convocação já foi critério importante lá atrás. A falta de peças pode deixar o técnico de mãos atadas, mas chamá-las de volta também seria um risco. O retorno de quem negou a seleção às vésperas de uma Olimpíada pode não cair bem no grupo que conquistar a vaga. Isso porque, seja qual for a seleção que vai disputar o Pré-Olímpico, o Brasil não deverá ter muitos problemas para assegurar seu lugar em Tóquio em uma chave com República Dominicana, Camarões e Azerbaijão.

 

Mas é um ano pré-olímpico, e Zé Roberto está longe de ter um time. Da sonhada renovação, poucas se firmaram. Drussyla, apesar de ter enfrentado problemas físicos nos últimos anos, parece ser a principal aposta da nova geração. Roberta, que ainda sofre com bons e maus momentos, ganhou a sombra de Macris - dona de uma temporada espetacular no Minas, mas que ainda precisa ser posta à prova na seleção. Gabi Cândido, depois de uma ótima Superliga, teria sua primeira chance na seleção principal. Mas também disse não - e ainda não explicou o porquê.

 

Gabi (já uma veterana de seleção apesar dos 24 anos), Natália e Tandara, em forma, são o maior trunfo da equipe. Há, também, outros bons nomes em meio a algumas incógnitas. Falta saber como o técnico vai tampar os buracos que foram deixados por quem não quis ficar.

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