Afetado na campanha eleitoral pela revelação de que o Supremo Tribunal Federal havia homologado duas delações que o citavam, o governador mato-grossense Pedro Taques (PSDB) ordenou o levantamento de tudo o que pudesse desmontar as menções apresentadas contra ele pelos colaboradores.
A demanda fez funcionários revirarem a noite organizando documentos. Já reunidos, esses papéis são considerados uma espécie de dossiê de defesa prévia de Taques em seus últimos dias no Palácio Paiaguás, sede do governo do estado.
O tucano tentou a reeleição, mas amargou um terceiro lugar numa disputa em que Mauro Mendes (DEM) venceu no primeiro turno. Durante seu mandato, presenciou a prisão de aliados —como o ex-Casa Civil Paulo Taques, seu primo, e o ex-secretário da Educação Permínio Pinto— e a transformação de outros em desafetos —como o promotor Mauro Zaque, ex-secretário de Segurança Pública, e até um deputado do PSDB, Baiano Filho. Na campanha, mais rompimentos: a juíza Selma Arruda, candidata ao Senado pelo PSL, anunciou que deixou de apoiá-lo ao saber das homologações.
Ela foi eleita. Agora, com os documentos, o governador tenta se preservar em um estado cujas operações policiais têm mirado políticos e agentes públicos.
Alguns dos principais alvos foram o ex-governador Silval Barbosa, o ex-presidente da Assembleia Legislativa José Riva e Paulo Taques. Outro objetivo de Pedro Taques é resguardar a imagem política que construiu, de combatente intolerante da corrupção: ex-procurador da República, pediu a prisão de Jader Barbalho (MDB-PA) em 2002.
Ao longo do mandato como governador, ele já vinha se antecipando juridicamente aos escândalos que poderiam afetá-lo. Depois que Mauro Zaque deixou a Secretaria de Segurança Pública, no fim de 2015, acusou o Taques de ter conhecimento de um esquema de grampeamento de adversários e pediu investigação à Procuradoria-Geral da República. Quando o caso foi a público, o próprio Taques, em ofício, também solicitou que a PGR o investigasse.
Atualmente, o caso é apurado no âmbito do STJ (Superior Tribunal de Justiça). Zaque diz, no entanto, que Taques só pediu para ser investigado quando caso não pôde ser mais abafado.
À Folha, afirma que deixou a Secretaria de Justiça no fim de 2015 à espera de medidas contra os autores dos grampos e, um ano depois, "o governador não havia tomado providências a esse respeito". Outro caso em que Taques se adiantou foi a prisão do empresário Alan Malouf, que diz ter sido operador financeiro da campanha do governador em 2014.
Um dia antes de Malouf ser preso, o tucano registrou um depoimento em cartório afirmando que o empresário diria que o retaliaria. Malouf também é o principal motivo para Taques ter passado os últimos meses juntando material de defesa.
Ao ser preso, em meio a uma operação que desvendou um esquema de corrupção na Secretaria de Educação, o empresário abriu a boca: disse em delação que fazia parte de um grupo que geria o caixa dois de campanha de Taques. Segundo ele, foram captados R$ 10 milhões para o então candidato dessa forma.
Ele ainda citou supostos benefícios concedidos a empresários pela gestão do tucano. O governador ataca esses pontos: afirma que não há provas concretas apresentadas por Malouf e diz que contrariou seus interesses.
Em seu dossiê, aponta que o estado está em disputa judicial contra a família do empresário para não pagar R$ 40 milhões em um terreno em Barra das Garças (a 500 km de Cuiabá). Também diz que empresas de Malouf e sua família perderam ou foram desclassificadas em licitações e, ainda, que não beneficiou outras firmas citadas pelo delator, como a cervejaria Petrópolis.
Por fim, afirma que sua própria gestão investigou e anulou contratos irregulares na pasta de Educação, evitando prejuízo mais ao estado. Um dos pontos sensíveis da delação diz respeito à continuidade dos serviços de empréstimos consignados com o estado.
Esse episódio, assim como o dos grampos e outros, envolvem Paulo Taques, o primo do governador. Malouf diz que o grupo de empresários que arrecadou caixa dois para a campanha esperava que Pedro Taques rompesse a parceria com a empresa que prestava o serviço ao governo anterior e os contratasse —no entanto, Paulo Taques teria frustrado essa possibilidade ao receber "caixa três" da firma. O contrato antigo, no entanto, foi rompido pelos primos Taques após um ano e meio de imbróglios legais.
Questionado se acha que o primo errou em algum dos casos que o envolvem em seu governo, o governador Pedro Taques usa esse caso como exemplo do que considera acusação infundada. "Eu não tenho elementos para dizer isso. Na época falaram que ele recebia dinheiro do consignado e está aí a demonstração...", disse à Folha.
Procurado, Paulo Taques afirma que Alan Malouf criou várias mentiras, não conseguirá prová-las e será processado por isso. Ele diz que tem convicção de que "houve um jogo de poder e, como não conseguiram atingir o governador, tentaram fazer isso por meio de seu primo, que tem o mesmo sobrenome".
O ex-Casa Civil não se manifesta sobre o caso dos grampos porque diz que uma determinação do STJ o impede de fazer isso. Procurado, o advogado de Alan Malouf, Huendel Rolim, diz que alegações do governador "corroboram o que já foi dito por Alan Malouf em seus depoimentos" e que "causa espécie que o Governador tenha utilizado da máquina pública para patrocinar interesses pessoais de sua defesa, na produção de tais relatórios".
"Destaca-se, portanto, até em esclarecimento a toda sociedade, que a Colaboração Malouf é complexa, e será submetida ao crivo do contraditório judicial, mas, desde já, é de bom alvitre consignar, que nenhuma das alegações referentes ao caixa 2 são refutadas, sendo essas mais graves."
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