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INTERNACIONAL Sexta-feira, 27 de Novembro de 2020, 15:28 - A | A

Sexta-feira, 27 de Novembro de 2020, 15h:28 - A | A

ALVO EM POTENCIAL

Cientista nuclear iraniano é morto em atentado nos arredores de Teerã

Mohsen Fakhrizadeh, apontado por agentes de inteligência no Ocidente como um "Robert Oppenheimer" do Irã, era considerado um alvo em potencial; chanceler afirma ver papel de Israel no assassinato

O Globo e agências internacionais

Um dos principais cientistas nucleares iranianos, Mohsen Fakhrizadeh, foi morto nesta sexta-feira nos arredores de Teerã, no que parece ter sido um assassinato premeditado. Em comunicado, o Ministério da Defesa confirmou os relatos feitos anteriormente pela imprensa local, afirmando que o veículo do cientista foi atacado na cidade de Damavand. Ele chegou a ser levado a um hospital, mas não resistiu. No texto, o ministério ainda condenou o que chamou de "ato covarde".

 O ministro da Defesa, o brigadeiro-general Amir Hatami, declarou que o ataque demonstra "a profundidade do ódio que os inimigos nutrem pela República Islâmica", uma posição seguida por outras lideranças militares, que também fizeram os já esperados apelos por vingança contra os responsáveis.

No Twitter, o chanceler Javad Zarif seguiu na mesma linha, afirmando ver "sérias indicações de um papel israelense", e dizendo que o ato sugere que seus responsáveis estão "desesperados" na busca pelo início de um conflito.

O Irã conclama a comunidade internacional, especialmente a União Europeia, a pôr fim aos vergonhosos padrões duplos e condenar esse ato de terror de Estado

"O Irã conclama a comunidade internacional, especialmente a União Europeia, a pôr fim aos vergonhosos padrões duplos e condenar esse ato de terror de Estado", escreveu o ministro.

Segundo informações da imprensa, houve uma explosão perto do carro de Fakhrizadeh, seguida por tiros. Houve confronto com os responsáveis pela ação, mas ainda não há detalhes sobre mortos e feridos.

Esse foi um dos mais relevantes assassinatos de pessoas ligadas ao programa nuclear iraniano. Antigo alvo de serviços secretos de rivais de Teerã, Mohsen Fakhrizadeh era apontado como o principal nome por trás de projetos para desenvolver secretamente uma bomba atômica até o início do século.

Em reportagem de 2014, publicada meses antes de o acordo internacional pelo qual o Irã abriu mão formalmente de produzir a bomba ser fechado, funcionários de inteligência ouvidos pelo New York Times afirmaram que ele era a pessoa que mais se aproximava de um Robert Oppenheimer no Irã — uma referência ao físico americano que dirigiu o Projeto Manhattan, responsável pela primeira bomba atômica da História.

Fakhrizadeh ainda apareceu em pelo menos dois relatórios da ONU, que apontavam sua ligação não apenas com uma potencial militarização do programa nuclear, mas também com o desenvolvimento de mísseis balísticos.

Na reportagem, um dos integrantes da equipe que negociava o acordo afirmou que, por conta de seu conhecimento extenso sobre as atividades nucleares iranianas, Fakhrizadeh vivia “escapando dos assassinos”: anos antes, o Mossad, o serviço secreto israelense, matou pelo menos quatro cientistas nucleares iranianos, na maior parte das vezes usando pequenos explosivos. As alegações apareceram no livro “Espiões contra o Armagedom: por dentro das guerras secretas de Israel”, de Dan Raviv and Yossi Melman, publicado em 2012.

Em 2018, o nome de Fakhrizadeh foi mencionado pelo premier israelense, Benjamin Netanyahu, em uma de suas apresentações acusando o regime de Teerã de buscar armas nucleares. Naquele mesmo ano, a agência de notícias iraniana Valla afirmou que o cientista foi alvo de uma tentativa de assassinato.

Em uma sequência no Twitter, Trita Parsi, vice-presidente executivo do centro de estudos americano Quincy Institute, disse ver razões para acreditar que Israel esta por trás do atentado contra o cientista nuclear: para ele, os israelenses têm a capacidade de fazer tal ação, têm a motivação e já realizaram ações do gênero no passado. A suspeita é compartilhada por três oficiais do serviço de Inteligência dos EUA, ouvidos pelo New York Times.

O governo israelense não se pronunciou, assim como o Pentágono. Já o presidente dos EUA, Donald Trump, retuitou uma postagem do New York Times — um jornal frequentemente atacado por ele — reportando a morte do cientista, além de duas publicações do jornalista Yossi Melman nas quais traz informações sobre o ataque e afirma que esse foi um "grande golpe psicológico e profissional no Irã".

O atentado ocorre meses depois de uma misteriosa série de explosões em locais ligados às atividades nucleares e militares do Irã, incluindo na central de Natanz, onde ocorre boa parte do processo de enriquecimento de urânio do país.

'Pressão máxima'
Desde a decisão de Trump de deixar o acordo sobre o programa nuclear iraniano, em 2018, e a subsequente adoção de uma política extrema de sanções, o Irã vem descumprindo parte de seus compromissos, incluindo o que estipula um grau máximo de enriquecimento de urânio e um volume máximo de combustível nuclear estocado em seu território.

Ao mesmo tempo, o volume da retórica militar e incidentes sérios envolvendo EUA e Irã, como a derrubada de drones perto do Estreito de Ormuz, em 2019, quase levaram a um conflito aberto. Essa escalada chegou ao seu ápice em janeiro, quando um ataque americano matou o general Qassem Soleimani, responsável por boa parte das operações e alianças militares da Guarda Revolucionária no exterior. A resposta veio através de um ataque de mísseis contra uma base usada por forças dos EUA no Iraque.

A Casa Branca, ainda sob Trump, vem incitando aliados na região, como Israel e a Arábia Saudita, a agirem em conjunto contra Teerã, e chegou ao ponto de cogitar uma operação militar contra o Irã, como revelou o New York Times há pouco mais de uma semana. Tal estratégia, adotada mesmo depois da sua derrota na eleição presidencial, pode fechar ainda mais a janela de ação do novo líder do país, Joe Biden, que assume em janeiro, mas já sinalizou que quer retomar o diálogo com Teerã.

Segundo Trita Parsi, o ataque pode complicar ainda mais os planos do democrata: ele vê nessa ação, caso tenha mesmo sido realizada por Israel, uma espécie de "sinal verde" de Trump para ações diretas em solo iraniano, o que pode, em último caso, levar a um conflito aberto no Oriente Médio. E mesmo que o Irã simplesmente não adote medidas de retaliação neste momento, as posições do país em negociações futuras tenderão a ser ainda mais duras do que foram no passado.

"Estamos agora em uma situação pior para os próximos 50 dias. O maior impacto de ataques do tipo não é atrasar o programa nuclear, mas dificultar a diplomacia para Biden. Trump não vai criticar esses ataques, ele pode até estar os encorajando e os ajudando", escreveu Parsi. "Se preparem para um caminho acidentado até a posse de Biden. Se Israel estiver por trás do assassinato, não tenham ilusões sobre o desejo de Netanyahu de arrastar os EUA para mais uma guerra sem fim no Oriente Médio."

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