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OPINIÃO Segunda-feira, 07 de Dezembro de 2020, 08:54 - A | A

Segunda-feira, 07 de Dezembro de 2020, 08h:54 - A | A

AUREMÁCIO CARVALHO

Ora, dane-se a Constituição

A democracia exige alternância de poder, não conchavos e interesses escusos

AUREMÁCIO CARVALHO

Na época da Ditadura (1964/84), o Cel. Jarbas Passarinho, então ministro da Educação, na reunião palaciana com o Gen. Geisel, presidente de plantão, ao se discutir a edição do AI-05- que fechou as liberdades democráticas e tudo o mais que conhecemos ( AI-05, aliás, de saudosa memória dos bolsonaristas), o Cel. Passarinho disse ” danem-se os escrúpulos”. É o mesmo que, agora, o STF está dizendo: “Dane-se a CF”.

De guardiões da Carta Magna, mais uma vez, se tornam seus carrascos; a rasgam descaradamente, no caso da reeleição da Mesa do Congresso (Câmara Federal e Senado), ao arrepio do § 4º do art. 57 da CE, que veda expressamente a recondução ao mesmo cargo, para a eleição subsequente. As manobras e criatividade do relator Min. Gilmar Mendes espantam até calouros do curso de Direito. O ministro apela para uma interpretação sistemática, dizendo que a Constituição dá liberdade para o Congresso agir como bem entender, que seria assunto ‘interna corporis’.

A Constituição, ao contrário, é clara sobre reeleição, e não existe essa possibilidade. Essa jabuticaba jurídica, criada para servir aos poderoso coronéis da política. Ou, o que se vê é uma ação para acomodar interesses de determinados partidos políticos e grupos.

A manobra do STF, na prática, reeleição, abre caminho para que Maia e Alcolumbre concorram em fevereiro de 2021, quando está marcada a disputa pela cúpula do Congresso

A democracia exige alternância de poder, não conchavos e interesses escusos. O correto para os que pretendem mudar a constituição é por meio de emenda constitucional (PEC). Por mais que seja o guardião da Constituição, o Supremo não pode reescrever a Carta Magna a seu bel prazer, ou por injunções políticas de momento, interpretações casuístas e ativismo judicial. É desonrar a toga.A ação analisada na Corte foi impetrada pelo PTB. O partido pede a suspensão das normas internas do Congresso que abrem margem para a reeleição dos presidentes da Câmara e do Senado. No entanto, o relator do caso no STF, ministro Gilmar Mendes, votou pela possibilidade de recondução, entendendo que a questão pode ser decidida, internamente, pelo Parlamento. O voto dele foi dado ainda na madrugada de ontem e longe dos holofotes da opinião pública. Até o momento, seguiram a análise de Mendes os ministros Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski.

O novo ministro “garantista”, fiel ao seu guru que o indicou, aceita a recondução de Alcolumbre, mas não da Rodrigo Maia. Começa a pagar o favor da indicação. Não é, até agora, ministro, mas, líder do governo no STF. O julgamento ocorre em plenário virtual, no qual os ministros têm um prazo para incluir os votos no sistema, sem votação oral e discussão. No “escurinho do cinema”; ambiente propricio a manobras nada republicanas.

Deputado constituinte e ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim afirmou ter ficado “perplexo” com a discussão na Corte sobre a possibilidade de os presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), se reelegerem nos cargos. Contrário à recondução, ele citou que a Carta Magna de 1988, que ajudou a elaborar, é clara ao abordar a questão. “Não é assunto para se estar discutindo porque tem uma regra expressa na Constituição”, afirmou.

Sobre a importância da vedação, ele acrescenta: “Eu me lembro das razões”, contou Jobim. “A decisão do ‘Doutor Ulysses’ era para evitar a perpetuação de presidentes.”. Infelizmente, o que mais vemos a perpetuação de coronéis políticos no comando, por anos, das Mesas da Assembléia Legislativas, inclusive em Mato Grosso. Perdeu o Brasil, perdeu a “Carta Cidadã”. Se aprovada a reeleição, é “abrir a porteira” para outras reeleições, quem sabe, um etreno presidente (um novo Fidel ou Maduro). Assim, alcançaríamos o primeiro mundo (Coreia do Norte, Cuba, Turquia).

Na sua mente fértil e criativa, Gilmar Mendes, considerou que a proibição à reeleição no Legislativo surgiu no regime militar. Ele argumentou que a emenda constitucional que liberou a recondução do presidente da República, em 1997, permitiu um “redimensionamento” de toda a Constituição. Ou seja, a CF hoje é “fake news”, precisa de “nova interpretação”.

É papel do STF fazer uma “releitura” oportunista da CF? Não seria seu papel cumpri-la, como juram defendê-la ao assumir os cargos?.

O prezado/a leitor/a, mesmo não versado em Direito, tem dúvidas da clareza do preceito constitucional (§ 4º do artigo 57 da CF, que diz: “Cada uma das Casas reunir-se-á em sessões preparatórias, a partir de 1º de fevereiro, no primeiro ano da legislatura, para a posse de seus membros e eleição das respectivas Mesas, para mandato de dois anos, vedada a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subsequente”.? Eu também, rábula já por 26 anos, não tenho.

É de uma clareza solar. Creio que até os alunos daquela famosa faculdade de Direito de SP, que tem um curso de Direito “corujão” (aulas das 03:00 às 06:00 hs), para atender os alunos das baladas, sabem ler o artigo. Os ilustres “deuses do Olímpo”- ministros do STF, tem sérias dúvidas. Mas, o que está em jogo, é a desmoralização da CF e das leis, que, no Brasil, “pegam ou não”; e, comumente, só são aplicadas aos ladrões de galinha e batedores de carteira. Os bem-nascidos, brancos de preferência, donos da Capitania Hereditária do Brasil, estão acima e imunes à aplicação das leis.

A manobra do STF, na prática, reeleição, abre caminho para que Maia e Alcolumbre concorram em fevereiro de 2021, quando está marcada a disputa pela cúpula do Congresso. E, sem dúvida, para outras eleições subsequentes, pois ninguém é de ferro: é preciso “ouvir as bases-STF”, o legislador de plantão. Como dizia um presidente da república em 1904, “ a constituição brasileira tem um furo: esqueceram de citar explicitamente os verdadeiros donos do poder- os coronéis políticos”.

Acertou na mosca. Nesses tempos de vivemos, de saudosa e reitera memória da ditadura, nada mais espanta. Quem sabe um milagre de 6x5- ainda é possível, venha frear esse vexame que estamos prestes a fazer: rasgar mais uma vez a Constituição, para agradar poderosos? Se não, é esperar outras “leituras criativas” do STF e continuar, celeremente, nossa atual caminhada para o caos político e social que hoje assistimos a nível federal. É esperar pra ver.......

 

AUREMÁCIO CARVALHO é advogado.

 

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