Após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, dizer que teve uma “química excelente” com Lula em um encontro de menos de um minuto na 80ª Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), os dois chefes de Estado devem conversar por telefone nos próximos dias.
O governo brasileiro, no entanto, mobiliza-se para garantir que a reunião seja produtiva. E, principalmente, sem riscos de constrangimento público.
Isso aconteceu com o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky — que teve um encontro tenso, e filmado, em Washington em fevereiro — ou do caso do presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa — alvo de acusações por parte de Trump.
O telefonema entre Trump e Lula pode ocorrer com a presença do vice-presidente brasileiro, Geraldo Alckmin, o principal negociador do país em prol da redução das tarifas impostas pelos Estados Unidos. A data ainda não está definida.
Entre a expectativa e o valor simbólico
O diálogo entre os dois chefes de Estado, todavia, não deve destravar imediatamente as taxações a produtos brasileiros, mas tem um valor simbólico nas negociações feitas pelas equipes técnicas e por diplomatas de ambos os países.
Vale lembrar que, até o encontro na Assembleia Geral da ONU na última semana, o governo brasileiro não conseguia avançar em uma negociação com líderes dos Estados Unidos.
A estratégia brasileira era agir em três frentes:
- Reuniões de Alckmin com o secretário de Comércio dos EUA, Howard Lutnick;
- Encontro do chanceler brasileiro, Mauro Vieira, com o secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio;
- Diálogo do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, com o secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent.
No entanto, a última reunião de Haddad com Bessent foi cancelada e, no mesmo dia, o secretário do Tesouro recebeu Eduardo Bolsonaro (PL-SP) em um evento exibido nas redes sociais — o “furo” causou mal-estar no governo brasileiro.
Encontro requer cautela
Especialistas avaliam que o aceno de Trump ao governo brasileiro é positivo, mas exige prudência.
A especialista em relações internacionais Natali Hoff explica que a cautela com os EUA é necessária devido às recentes ações de Trump com outros países.
Nelas, o americano colocou o interlocutor em uma posição de perda significativa para que ele acabasse concordando com acordos mais prejudiciais.
“A gente viu isso acontecendo com União Europeia, Japão, Coreia do Sul. Então, os EUA ameaçaram tarifas muito altas para que esses atores negociassem com ele e para que, nessas negociações, as tarifas continuassem muito altas, mas mais baixas do que foi ameaçado. Ou seja, para que ele, mesmo cedendo, ainda conseguisse ter um ganho significativo”, explica.
Para Hoff, existe uma possibilidade de distensionamento entre os dois países. Ela explica que, mesmo com a necessidade de cautela, as novas movimentações e mudanças na postura do presidente norte-americano são positivas.
“[A questão] É realmente entender qual seria a forma que essa conversa iria se dar e realmente quanto o Donald Trump está disposto a negociar aspectos que são negociáveis com o governo brasileiro, o que passa por questões econômicas e envolve deixar de lado as demandas políticas que ele apresenta”, frisa.
Entenda
Em meio à tensão diplomática com o Brasil, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, afirmou que ele e o líder brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, tiveram uma “química excelente” ao se cumprimentarem antes do início da Assembleia Geral da ONU.
Trump também confirmou um encontro entre os dois mandatários nos próximos dias.
Segundo Trump, ele entrava para discursar enquanto Lula saía, quando se os dois se viram.
“Nos abraçamos”, disse o presidente dos EUA. “Ele me parece um homem muito agradável. Ele gostou de mim, eu gostei dele. E eu só faço negócios com pessoas que eu gosto. Tivemos, ao menos por 39 segundos, uma excelente química. É um bom sinal. Sem a gente [EUA], eles [Brasil] vão falhar, assim como outras nações”, declarou Trump.
A fala ocorreu após o presidente americano discursar sobre as tarifas comerciais aplicadas pelos EUA a outros países.
Segundo ele, a medida é um mecanismo para garantir a “soberania e segurança” do país, justificando, ainda, que durante “muitos anos”, diversas nações foram injustas com os EUA.
Na sequência, o líder norte-americano comentou que as tarifas aplicadas ao Brasil são uma resposta “aos seus esforços sem precedentes para interferir nos direitos e nas liberdades de nossos cidadãos americanos e de outros, com censura, repressão, armamento, corrupção judicial e ataques a críticos políticos nos Estados Unidos”.
Desde agosto, aos produtos brasileiros é acrescida uma taxa de 50% — o que fez com que as exportações ao país norte-americano caíssem 18,5% no primeiro mês de vigência do tarifaço.
A tensão diplomática entre os dois países piorou após Trump citar a situação do ex-presidente Bolsonaro como um dos motivos para a aplicação de sanções ao Brasil. Recentemente, Jair Bolsonaro e outros sete aliados foram condenados por golpe de Estado, entre outros crimes.
Posicionamento de Lula
A declaração de Donald Trump ocorreu após um discurso incisivo de Lula, que não recuou na defesa da soberania nacional e classificou as tarifas impostas pelos EUA como injustas.
“Atentados à soberania, sanções arbitrárias e intervenções unilaterais estão se tornando regra. Existe um evidente paralelo entre a crise do multilateralismo e o enfraquecimento da democracia. O autoritarismo se fortalece quando nos omitimos frente à arbitrariedade”, discursou o petista.
Lula afirmou ainda que, “quando a sociedade internacional vacila na defesa da paz, da soberania e do direito, as consequências são trágicas”.
“Em todo o mundo, forças antidemocráticas tentam subjugar as instituições e sufocar as liberdades. Cultuam a violência, exaltam a ignorância, atuam como milícias físicas e digitais e cerceiam a imprensa. Mesmo sob ataques sem precedentes, o Brasil optou por resistir e defender a sua democracia reconquistada há 40 anos pelo seu povo depois de duas décadas de governo ditatorial”, destacou.
Em recado direto a Trump, Lula afirmou que “não há justificativa contra as medidas unilaterais e arbitrárias contra as nossas instituições e nossa soberania”.
“A agressão contra a nossa independência do poder judiciário é inaceitável. Essa ingerência em assuntos internos conta com o auxílio de uma extrema-direita subserviente e saudosa de antigas hegemonias. Falsos patriotas arquitetam e promovem publicamente ações contra o Brasil. Não há pacificação com impunidade”, salientou o mandatário brasileiro.
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