A Reforma Tributária, já aprovada e com início marcado para 2026, impõe aos municípios de Mato Grosso uma das transições fiscais mais desafiadoras das últimas décadas. A substituição de tributos como ICMS, ISS, PIS e Cofins pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) mudará radicalmente a forma de arrecadação. O novo modelo, baseado no consumo, tende a favorecer regiões mais populosas e de grande mercado consumidor, enquanto ameaça reduzir significativamente a receita de municípios que hoje dependem da produção industrial e agropecuária.
O alerta foi reforçado pelo secretário de Fazenda, Rogério Gallo, durante encontro realizado em agosto de 2025. Segundo ele, cidades mato-grossenses podem registrar queda de até 30% na arrecadação já nos primeiros anos da transição. Esse encolhimento atinge diretamente áreas essenciais, como saúde e educação, que têm percentuais constitucionais fixos de investimento e dependem da receita tributária para manter programas básicos em funcionamento.
A preocupação se justifica: Mato Grosso, com economia fortemente voltada ao agronegócio e à produção industrial, construiu sua arrecadação em cima do ICMS. No entanto, com o novo sistema, a lógica muda. O imposto deixará de ser cobrado no local da produção e passará a ser recolhido no destino do consumo. Na prática, municípios produtores podem perder protagonismo, enquanto grandes centros consumidores ganham uma fatia maior da arrecadação.
Para o advogado tributarista Marciano Nogueira da Silva, do escritório MNS Advogados, a realidade exige reação imediata: “A reforma muda as bases de arrecadação. Municípios estruturados na exportação, na indústria ou em produção, antes premiadas com incentivos fiscais, agora podem ver sua arrecadação encolher drasticamente. Nesse cenário, recuperar créditos, como IRRF ou encargos sobre energia pagos indevidamente, não é apenas um direito — é uma estratégia de sobrevivência orçamentária.”
Entre as medidas apontadas por especialistas, está a possibilidade de os municípios recuperarem créditos tributários recolhidos indevidamente nos últimos anos. São valores que, muitas vezes, ficam esquecidos na burocracia tributária, mas que podem aliviar os cofres públicos em um momento crítico. O Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF), por exemplo, é frequentemente recolhido de maneira que reduz o retorno às prefeituras. Já nas contas de energia elétrica, tributos como ICMS, PIS e Cofins podem ter sido pagos a maior, gerando direito à restituição. Situações semelhantes se aplicam a despesas com transporte e outros serviços essenciais.
Além disso, a reforma prevê fundos de compensação para tentar equilibrar perdas entre os entes federativos. Apesar disso, prefeitos e secretários de Fazenda não podem se dar ao luxo de depender apenas dessas transferências, cuja distribuição ainda é cercada de incertezas. A preparação, segundo especialistas, passa por três eixos principais: fortalecer a arrecadação própria, intensificar o combate à sonegação e acionar a via administrativa ou judicial para recuperar créditos indevidos.
Nos bastidores, órgãos de arrecadação já trabalham para operacionalizar o novo modelo. Empresas de tecnologia fiscal iniciaram testes para adequar notas fiscais eletrônicas ao IBS e à CBS. O Comitê Gestor do IBS foi oficialmente instalado em agosto, com a missão de coordenar a arrecadação e a distribuição dos recursos. Até 2032, o país viverá um período de transição, no qual os tributos atuais serão gradualmente substituídos até sua extinção definitiva em 2033.
Apesar da preocupação, especialistas também destacam pontos positivos. A promessa de maior transparência na cobrança de impostos pode fortalecer a cidadania fiscal. Cidadãos e gestores passarão a visualizar claramente quanto pagam de tributos em cada operação, reduzindo distorções históricas e fortalecendo a fiscalização social.
Ainda assim, para municípios de Mato Grosso, a reforma representa mais riscos do que ganhos imediatos. A queda de receitas ameaça investimentos feitos nos últimos anos e pode comprometer o futuro de áreas estratégicas. Nesse cenário, a preparação técnica e o suporte jurídico especializado tornam-se indispensáveis.
“Não se trata apenas de adaptação burocrática”, reforça o advogado Marciano Nogueira. “Estamos falando de planejamento fiscal estratégico, de sobrevivência municipal em um novo modelo. Aqueles que se anteciparem, identificarem créditos e se reorganizar terão melhores condições de atravessar esse processo sem comprometer serviços essenciais.”
A partir de 2026, a reforma deixa de ser promessa e passa a ser realidade. Para as cidades de Mato Grosso, a forma como enfrentarem essa transição definirá se o novo sistema será lembrado como oportunidade de modernização ou como a origem de uma crise orçamentária sem precedentes.
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