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OPINIÃO Sexta-feira, 24 de Outubro de 2025, 09:00 - A | A

Sexta-feira, 24 de Outubro de 2025, 09h:00 - A | A

Valmir Nascimento Milomem

Em busca de virtudes

Valmir Nascimento Milomem

Hoje, fala-se muito em ética e pouco em virtudes. Não me entendam mal. A ética é valiosa e deveria nos conduzir à vida honesta e íntegra. Contudo, no tempo presente, ela parece ter sido resumida ao campo da filosofia moral que mais problematiza e expõe dilemas morais do que necessariamente inspira a viver corretamente.

Derek Bok, um antigo reitor da Universidade de Harvard, resumiu bem isso ao dizer que o curso atual de ética aplicada não busca transmitir um conjunto de verdades morais, mas tenta incentivar o aluno a refletir cuidadosamente sobre complexas questões da moralidade.

Numa época em que questões éticas são ponderadas, problematizadas e racionalizadas à luz de um inventário de opções da teoria moral, sobra pouco espaço para falar sobre retidão, caráter, internalização de valores e virtudes morais efetivas.

O problema é que isso produz aquilo que C. S. Lewis chamou de “homens sem peito”, pessoas que perderam a capacidade de amar o bem e rejeitar o mal, tornando-se presas fáceis do relativismo e do cinismo moral. Para Lewis, o “peito” simboliza o centro moral e afetivo do ser humano.

Uma abordagem ética que não conduz ao desenvolvimento de virtudes humanas é falha por natureza. Afinal, “virtude é a saúde da alma”, escreveu A.D. Sertillanges.

Na antiguidade, virtus descrevia a coragem e o valor dos soldados e heróis. Os gregos usavam a palavra aretê no sentido de perfeição ou excelência em um determinado campo, como a arte, a política, a guerra, ou a vida moral. A Bíblia também emprega esse termo, podendo ser traduzida por hombridade, bravura, excelência ou virtude.

Aretê é um princípio espiritual e ético, aplicável a qualquer aspecto da vida. Seu objetivo final não é o sucesso ou a vida boa em termos materiais e financeiros, mas a excelência e a felicidade em termos de realização. Tudo decorre da graça divina, mas ao homem é exigida a responsabilidade de se desenvolver e crescer; isto é, florescer. Deus dá o solo, mas o homem põe a semente!

Para o seu desenvolvimento, as virtudes precisam ser ensinadas, mas sobretudo cultivadas pelo hábito. Afinal, antes de sermos seres que pensam, somos seres que desejam. Somos essencialmente orientados por alguma ideia de vida boa, por alguma imagem daquilo que seja "florescer", mesmo que não tenhamos refletido profundamente sobre isso.

O Pequeno Príncipe resume isso de um jeito interessante: "Se você quer construir um navio, não chame as pessoas para juntar madeira, nem lhes atribua tarefas e trabalho, mas ensine-as a desejar a infinita imensidão do oceano". Faz todo sentido!

É com base nesses desejos que desenvolvemos uma série de hábitos que ajudam a moldar o nosso caráter. Virtudes, portanto, são hábitos bons, que funcionam como uma disposição interna para o bem, que uma vez exercitados com frequência passam a fazer parte de quem você é.

As virtudes, nos ensinam Aristóteles e Tomás de Aquino, são apreendidas pela imitação e pela prática, não isoladamente, mas de maneira reiterada, constante e duradoura, formando hábitos que são internalizados e gravados em nós. Os bons hábitos, portanto, possuem uma força propulsora incrível para nos moldar. Nas palavras de Comte-Sponville: “Virtude é uma força que age, ou que pode agir”.

Isso significa que nossos hábitos revelam muito sobre nós e sobre a nossa sociedade, para o bem ou para o mal. Se quisermos uma vida moldada por valores, em que floresçamos e permitamos que os outros também floresçam, e em que o agir ético não seja apenas uma teoria filosófica abstrata, vale a pena buscar a vida virtuosa: uma vida na qual os hábitos expressem a busca pelo bom, pelo justo e pelo saudável.

Valmir Nascimento Milomem é doutor em Filosofia Política e Social. Autor de diversas obras.

 

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