A juíza Célia Vidotti, da Vara de Ação Civil Públia e Ação Popuplar de Cuiabá, aceitou a acusação do Ministério Público Estadual (MPE) contra o ex-secretário de Estado de Saúde, Carlos Augusto Patti do Amaral, e mais quatro acusados de improbidade administrativa. Com eles, também se tornaram réus: o empresário Jair Lopes Martins e sua empresa Advocrata & Mercatto Indústria e Comércio de Produtos Ópticos Ltda, o ex-presidente do Instituto Lions da Visão, Whady Lacerda; e o próprio Instituto Lions da Visão.
A decisão é da última segunda-feira (27).
Segundo as investigações do MPE, os envolvidos são suspeitos de aturarem em um esquema de simulação de mais de 50 mil consultas, que foram pagas com notas fiscais frias, e teriam gerado um prejuízo de R$ 1,7 milhão ao Estado, na gestão do ex-governador e atual ministro da Agricultura, Blairo Maggi (PR).
“O autor conclui que nenhuma das 50.210 consultas oftalmológicas, supostamente realizadas pela empresa ré Advocrata & Mercatto, foram realizadas, bem como que as notas fiscais emitidas são “frias”, conforme confirmado pela médica Dra. Isadora Melissa Mohn Maciel, causando, assim, um prejuízo ao erário no valor de R$ 1.734.092,73 (um milhão e setecentos e trinta e quatro e noventa mil e dois reais e setenta e três centavos)”, diz a ação.
Em 2015, o grupo teve os bens e contas bloqueados em até R$ 1,7 milhão.
Entenda o caso
As investigações feitas pelo Ministério Público apontam que, o convênio entre o ex-secretário Carlos Amaral junto com Instituto Lions da Visão para a execução do "Projeto Mato Grosso e as Cores da Vida”, tinha como principal o objetivo atender 50 mil pessoas, com o custo total de R$ 4 milhões.
Com isso, R$ 2 milhões seriam gastos com material de distribuição gratuita e os outros R$ 2 milhões com serviços de terceiros (sem detalhar quais materiais e serviços seriam necessários ao projeto).
Segundo o MPE, o Instituto acionou e contratou a empresa Advocrata & Mercatto para a realização de serviços médicos oftálmicos, junto com consultas e exames, além de recepção de pacientes e cadastro no prontuário de atendimento, que totalizou o valor de R$ 1,7 milhão.
Porém, os serviços teriam sido prestados antes da assinatura do contrato entre as empresas. Sendo que, de acordo com as investigações, a Advocrata & Mercatto não existe no endereço mencionado no contrato e estaria suspensa desde antes da assinatura do convênio.
Outro lado
O Instituto Lions, no entanto, em sua defesa relatou que todas as irregularidades que foram descobertas pela Auditoria Geral do Estado, têm explicações, e que em momento algum houve dolo ou má-fé, tampouco demonstração de recebimento de vantagem indevida.
“A iniciativa do projeto em questão fazia frente à demanda populacional que não dispunha de condições para se consultar com oftalmologista e ainda adquirir os óculos necessários para corrigir o problema de visão”
Além disso, o Instituto relata que os trabalhos da Advocrata & Mercatto já começaram logo após as negociações verbais, motivo pelo qual somente posteriormente o contrato por escrito foi assinado entre eles. E, justificou que a informação de que a empresa Advocrata está com sua inscrição estadual suspensa é “irrelevante”, pelo fato de que houve apenas prestação de serviço e não comércio ou circulação de mercadorias.
“A assinatura posterior à realização dos mutirões é uma falha formal, uma irregularidade que não caracteriza improbidade administrativa”.
“Afirma que o Ministério Público confundiu-se com os depoimentos dos médicos, sendo na realidade o próprio Instituto Lions indiciou para requerida Advocrata seis médicos que costumavam a atuar regularmente junto ao Instituto, sendo que a empresa requerida procedeu a contratação destes e de mais 3 médicos de fora. Afirma que está comprovada a realização de mais de 50 mil consultas e que não há prova de conduta dolosa tampouco de prejuízo ao erário”.
O ex-secretário Augusto Amaral, que também é réu na ação, afirmou que sobre o convênio firmado entre eles, não teve pareceres que não fossem técnico e jurídico infavoráveis, e por esta razão não pode responder por eventuais falhas na execução do projeto, “tendo em vista que foi exonerado do cargo de Secretário de Saúde no dia 29.12.2010”.
Já Jair Martins e sua empresa Advocrata & Mercatto, negaram receber qualquer vantagem indevida em desconformidade com os princípios da administração pública.
“Destacam que realizaram um grande trabalho junto ao requerido Instituto Lions, e que a cada mutirão uma grande e complexa estrutura de atendimento à população era montada, com tendas climatizadas, equipe contratada para cadastramento, triagem, aplicação de colírios, equipamentos oftalmológicos para os exames, médicos e assistentes. Argumentam que o valor de R$ 1.734.092,73, recebido pelos serviços prestados, foi mais do que justo tendo em vista a complexidade da estrutura necessária”.
Réus da ação
A juíza Célia Vidotti, no entanto, analisou as denúncias do Ministério Público Estadual e rebateou a afirmação do Instituto Lions, que relatou ter sim capacidade técnica para executar os serviços contratados.
“Se o requerido Instituto possuía capacidade técnica para executar o convênio, é necessário esclarecer por qual motivo terceirizar o serviço, com a contratação da empresa requerida Advocrata & Mercatto, até mesmo porque os documentos que instruam a inicial apontam que desde a divulgação das ações, contratação de pessoal, organização dos espaços e disponibilização de equipamentos médicos foi feita pelo Instituto requerido. Apenas na formalização dessas ações, mediante a emissão de três notas fiscais, emitidas sequencialmente, é que aparece o nome da empresa requerida Advocrata & Mercatto”.
A juíza ainda recordou que as notas fiscais que atestam a suposta prestação de serviços indicam o valor de R$ 36,80 por consulta médica
“No entanto, ao que consta dos documentos, os médicos teriam recebido o valor de R$ 11 por consulta, de acordo com a tabela do SUS. É necessário esclarecer o emprego da diferença desse valor, já que há nos autos notas emitidas por outras empresas que forneceram materiais – tendas, consultórios, mesas, cadeiras etc – alimentação, custos que, ao que parece, deveriam ser arcados diretamente pela empresa requerida, até para justificar o valor da diferença acima mencionada”.
“Também na fase da entrega dos óculos aos pacientes supostamente atendidos, há nos autos documentos que comprovam que o Instituto Lions da Visão foi quem executou essa tarefa, solicitando auxilio ao Corpo de Bombeiros, ao Exército Brasileiro e a própria SETAS, mediante a disponibilização de mesas e cadeiras, obviamente, sem custos”.
Além disso, Vitotti explicou que o ex-secretário Augusto Amaral concordou com a proposta e plano de trabalho do Instituto Lions, liberando os recursos públicos, “mesmo diante da sonegação de informações essenciais para o acompanhamento da adequação e da razoabilidade na aplicação dos recursos públicos”.
“Embora o requerido tenha sido exonerado do cargo de Secretario de Estado de Saúde antes do término da vigência do contrato e, portanto, da exigibilidade da prestação de contas, verifica-se pelos documentos apresentados que o serviço contratado foi executado, em tese, quando o requerido ainda permanecia no cargo e, mesmo existindo cláusula expressa no convênio sobre a necessidade de controle de todas as etapas da execução, este não foi realizado. Aliás, há sérios indícios que a suposta execução do convênio ocorreu antes mesmo da assinatura do seu instrumento”.
“Nota-se que a proposta do convênio recebeu parecer favorável da Secretaria de Saúde mediante a necessidade de serem observadas algumas condições, especialmente quanto ao público alvo, que deveria advir da demanda reprimida do SUS, já regulada, e compreender o atendimento a oito macro regiões do Estado, o que não ocorreu”.
A juíza concluiu que o empresário Jair Martins e a Advocrata & Mercatto são suspeitos de terem sido os responsáveis pela emissão de “notas frias” para confirmar os gastos de R$ 1,7 milhão no convênio.
“Há sérios indícios que a referida empresa existe apenas no papel. Foram realizadas diligências in loco no endereço declarado como sede da referida empresa, no entanto, o local trata-se de uma residência alugada, sem qualquer indício do exercício de atividade comercial”.
“O que causa estranheza é que no registro da referida empresa na Junta Comercial do Estado do Tocantins, o objeto social elenca inúmeras atividades complexas e sem qualquer correlação, que abrangem a área médica humana e veterinária, comércio de tecidos, armarinhos, roupas, materiais de limpeza, papelaria, publicações, informática, eletroeletrônicos, telefonia e comunicação, material de construção em geral, fogos de artificio, brinquedos, laboratórios ópticos, construção de rodovias, ferrovias, aeroportos, edifícios, estações e redes de distribuição de energia elétrica, dentre outros. Isso tudo sem uma sede, um escritório!”, questionou a juíza, ao receber a ação.
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