Sem conseguir evitar que a oposição conquistasse o apoio necessário para pedir a votação acelerada do projeto de anistia na Câmara, o Palácio do Planalto acionou seus principais articuladores políticos para tentar esfriar a mobilização pela aprovação da proposta no plenário da Casa. A ofensiva terá o envolvimento direto da ministra Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais), que passou os últimos dias em contato com parlamentares tentando retirar nomes do requerimento de urgência, além de ministros de partidos aliados. A ideia é convencer o presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), e líderes de partidos a não pautarem a medida.
A pressão do governo fez com que ao menos dois deputados recuassem, mas não foi suficiente. Diante da ação dos governistas, o PL mudou de estratégia e apresentou ontem um requerimento com 262 assinaturas, cinco a mais do que o mínimo necessário. O plano inicial do líder da bancada, Sóstenes Cavalcante (RJ), era conquistar mais apoios até a semana que vem, após o feriado de Páscoa, quando os líderes da Casa se reunirão para discutir a pauta de votações.
Nova estratégia
Frente a retirada da assinatura da deputada Helena Lima (MDB-RR), o PL viu risco de mais parlamentares de partidos com cargos no Executivo recuarem e decidiu se antecipar. Na sexta-feira, o deputado Paulo Foletto (PSB-ES) já havia contestado a inclusão de seu nome no requerimento, sob argumento de que “houve um equívoco” de sua equipe, uma vez que ele é contra a proposta.
O projeto, apresentado em setembro do ano passado, prevê a anistia a pessoas que participaram de atos contra a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de 30 de outubro de 2022 em diante. O principal argumento dos defensores da medida é que o Supremo Tribunal Federal (STF) tem aplicado penas duras, de até 17 anos de prisão, para quem cometeu atos de vandalismo no 8 de Janeiro. A versão mais recente do texto, contudo, tem brechas que podem beneficiar o ex-presidente Jair Bolsonaro, réu no Supremo Tribunal Federal (STF) por tentativa de golpe.
A urgência, caso aprovada, permite levar a proposta diretamente ao plenário da Câmara, sem a necessidade de passar por comissões. No ano passado, o então presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), anunciou a criação de um grupo de trabalho para discutir o texto, o que foi visto pela oposição como uma forma de protelar o andamento da medida.
Lira está entre os que foram procurados por Sóstenes, mas se recusaram a assinar o requerimento de urgência. O ex-presidente da Câmara chegou a ser cotado para assumir um ministério no início do ano.
Nas conversas que teve com líderes de partidos nos últimos dias, Gleisi tem argumentado que o projeto, na prática, prevê uma “liberdade de golpe” no país. A ministra também tem dito avaliar como contradição parlamentares da base aliada apoiarem um projeto que perdoa quem tramou, segundo as investigações, o assassinato de Lula. A referência é ao documento “Punhal Verde Amarelo”, apreendido pela Polícia Federal nas investigações, que previa, além do assassinato do petista, a morte do vice, Geraldo Alckmin, e do ministro Alexandre de Moraes, do STF.
Partidos da base do governo Lula colaboraram com 146 das 262 assinaturas para a urgência do projeto de lei: 40 do União Brasil, 35 do PP, 28 do Republicanos, 23 do PSD, e 20 do MDB. O PL apresentou 88 assinaturas. Duas foram consideradas inválidas, a do próprio líder do PL, Sóstenes Cavalcante, e do líder da Oposição, coronel Zucco (RS). Isso porque ambos assinaram como líderes e não como deputados, o que não é considerado válido para o tipo de documento.
Articuladores de Lula tinham como meta reduzir o número de assinaturas até a próxima quinta-feira. Como mostrou a coluna de Bela Megale, a quantidade de assinaturas de integrantes da base gerou indignação no Palácio do Planalto e motivou ministros do Supremo a enviaram recados a membros do governo sobre a necessidade de entrar em campo para retirar apoios à anistia.
Após o requerimento de urgência ser protocolado, não é mais possível retirar assinaturas. Assim, nos próximos dez dias, o plano do Planalto é evitar que se crie um ambiente favorável ao texto. O assunto deve ser discutido na reunião de líderes, marcada para o dia 24. Mesmo com o número de assinaturas alcançado, o presidente da Câmara não é obrigado a colocar o requerimento em votação.
Na semana passada, Motta afirmou que não pautaria propostas que pudessem gerar “crises institucionais”. Aos líderes mais próximos, disse que “não é o momento” para avançar com o projeto.
Ao todo, há 1.039 requerimentos do tipo com status de “pronto para a pauta”, ou seja, que estariam prontos para votação em plenário, seja com as assinaturas necessárias, ou com apoio de líderes dos partidos.
A ofensiva do governo vai focar nos parlamentares do União Brasil, Republicanos, PSD e PP — juntas essas legendas deram 126 assinaturas. Dentre eles, o Planalto vai mirar primeiro aqueles que indicaram aliados para ocupar cargos na máquina federal.
De acordo com auxiliares de Lula, alguns dos deputados ainda têm dúvidas sobre o conteúdo do texto, enquanto outros já afirmaram ao governo que assinaram o requerimento de urgência, mas não apoiam o projeto no mérito.
— Esse projeto é uma depredação simbólica ao Supremo, coloca o país em uma brutal crise institucional. Estamos tentando sensibilizar que é projeto absurdo, que é meramente inconstitucional. Para tudo na Câmara e não resolve nada — diz o líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ).
'Governo sem moral'
Por outro lado, o vice-líder do PSD na Câmara, Reinhold Stephanes (PSD-PR), que assinou o requerimento, afirma que a mobilização do governo não terá efeito. A bancada deu 23 assinaturas.
— Sei que deputados receberam ligação do governo. Infelizmente foi com ameaças. Dois deputados me ligaram para contar, mas não cederam. O governo está sem moral. O mérito do assunto é correto — disse ele.
Uma possibilidade prevista no regimento da Câmara é o governo tentar protocolar outro requerimento pedindo o cancelamento do pedido de urgência do líder do PL. Para isso, porém, seriam necessárias 132 assinaturas entre os deputados que assinaram o protocolo original.
Motta está de férias até 22 de abril, deixando o deputado Altineu Côrtes (PL-RJ), vice-presidente da Câmara, no comando da Casa. Não há previsão, contudo, de o aliado de Bolsonaro colocar a urgência em votação até lá.
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